quinta-feira, 22 de abril de 2010

Problemas práticos do romantismo teórico - VIII

Por Jluismith

Um dos grandes problemas esquemáticos que os envolvimentos românticos sempre apresentaram pra mim é a total e absoluta ausência de qualquer mecanismo de garantia de reciprocidade ou compensação. É aquela coisa, você gostar de alguém não garante que essa pessoa goste de você no mesmo nível, quer dizer, nem mesmo implica que ela goste de você em qualquer nível ou sei lá, reconheça a sua existência no campo legal e moral (“sério, pra mim você não existe. é como...sei lá, eu sou a China e você é Taiwan. eu simplesmente não vou reconhecer a sua existência, sabe?”). Ou seja, basicamente não garante nada, se você for pensar.

Mas com o tempo a gente acaba, é claro, desenvolvendo mecanismos pra lidar com isso, de uma forma ou de outra. As experiências prévias, o amadurecimento, tudo isso acaba te ajudando a aprender a lidar com os diversos níveis de rejeição, tanto no âmbito romântico como em outros níveis interpessoais, profissionais e etc. Pequenas paixonites são resolvidas com horas de vídeo-game; grandes paixões com noites de bar, bebida e bate papo com amigos; amores de verdade com música triste no mp3, filmes da Meg Ryan, relacionamentos-rebote e o já famoso brigadeiro rosa (que simboliza como poucos alimentos o verdadeiro sentido da tristeza e degradação humana), e cada um vai aprendendo seus próprios limites e sua própria forma de lidar com o fato de não ser correspondido de uma forma ou de outra.

Mas uma coisa pra qual a gente acaba não se preparando bem com o passar dos tempos é pra ser a pessoa que não corresponde, ou seja, o outro vetor do processo de rejeição. Porque ser rejeitado é ruim, claro, droga, que saco, essa coisa que você ouviu caindo no chão e fazendo clec-clec foi meu pequeno coração partido, mas é algo com o qual, como eu já disse, a gente sabe lidar. Ela não gosta de mim então eu vou jogar vídeo-game, sair com meus amigos, beber, escrever algumas coisas engraçadas sobre o assunto no blog, talvez uns contos em que a personagem principal tenha o nome dela e bem, vou processando o fato. Simples, relativamente tranqüilo, sob controle. Been there, done that. Mas rejeitar é outra coisa.

Primeiro porque quando você rejeita existe sempre uma ponta de culpa. “Puxa, ela é tão legal, ela é bonita, ela é uma ótima garota, eu deveria querer ficar com ela, namorar, sei lá”. Mas não, você não quer. Por alguma razão dessas que você não compreende e que na sua cabeça é algo tão misterioso quanto o local pra onde vão as meias e guarda-chuvas perdidos, tudo que ela tem de legal e interessante (e podem ser até muitas coisas) simplesmente não tem tanta graça pra você quanto o que outra garota tem no momento ou mesmo tem muita graça, muito interesse, mas simplesmente não causa em você o que você considera necessário pra entrar num relacionamento. Sim, ela é ótima, legal, interessante e você gosta dela, mas por algum azar do destino você não está genuinamente apaixonado, e por outro azar, esse maior ainda, você é do tipo que só entraria num relacionamento se estivesse. (ou ela também pode ter te encontrado na fase do “não estou preparado para um relacionamento”, um conceito que vai merecer um post próprio)

E claro, com isso vem os riscos e as tentações. Afinal, ali está uma pessoa disponível e interessada (quase sempre também interessante) que está segurando uma plaquinha onde se lê o refrão de El Scorcho, do Weezer, e cujos sentimentos você sabe que não pode retribuir de forma honesta, sem mentir ou criar ilusões. E claro, é óbvio qual é a coisa certa a ser feita, mas é sempre um processo complicado fazer a coisa certa quando “a coisa certa” envolve dizer não para a garota atraente e totalmente empolgada contigo na mesa ao lado (e vamos admitir que essa situação não se apresenta lá com essa freqüência toda).

Com o tempo o que acabou ficando pra mim é que rejeitar é um processo tão (ou mais) complexo quanto ser rejeitado, com a diferença de que quando você é rejeitado você ao menos controla mais etapas e leva algum capital moral (pense em quantas boas músicas você conhece sobre pessoas que foram rejeitadas e em quantas escritas do ponto de vista de quem rejeitou, por exemplo). Negar afeto ou afundar um barco que a outra pessoa achava ser capaz de atravessar as mais íngremes corredeiras* acaba parecendo pra mim uma tarefa um tanto quanto mais complicada do que ouvir um “olha, João, eu gosto de você mas como amigo” ou um “não vai rolar mesmo, desculpa” ou um “não, senhor, não vendemos máscaras do Homem-Aranha, não, não temos previsão de vender, pare de ligar, sério, por favor”. Talvez seja uma questão de hábito, temperamento ou apenas falta de coragem pra lidar com certas situações, mas acho que no final das contas eu devo ser do tipo que prefere ouvir um não do que dizer um não. E, como eu já disse antes, com essa dificuldade para dizer não eu realmente teria uma fama muito, mas muito ruim no colégio se fosse uma garota.

*Este trecho foi livremente copiado de um daqueles livros da série “Bianca” lidos num consultório médico.

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Passando exaaatamente por isso...

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